O Instituto de Tecnologia em Fármacos promove debate para discutir os rumos da produção pública de medicamentos

 

Na última sexta-feira (11/5), o Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos/Fiocruz) promoveu o debate A Importância da Produção Pública de Medicamentos. O evento foi realizado no Complexo Tecnológico de Medicamentos (CTM), em comemoração ao 42º aniversário da unidade. Criado em 23 de abril de 1976, o Instituto tornou-se essencial para a implementação de políticas de assistência farmacêutica no Brasil.

O diretor Jorge Mendonça apresentou algumas conquistas de Farmanguinhos para a Saúde Pública e destacou os desafios que a unidade terá pela frente (Foto: Viviane Oliveira)

“São 42 anos de muito trabalho dedicado à pesquisa, desenvolvimento, geração de conhecimento, muita produção de medicamentos e, acima de tudo, muita produção de saúde para população brasileira”, enfatizou o diretor Jorge Souza Mendonça. Dentre as conquistas ao longo dessas quatro décadas, ele destacou a fabricação de antirretrovirais, licenciamento compulsório do efavirenz, produção emergencial do oseltamivir; atuação contra patentes de medicamentos estratégicos; e o protagonismo da unidade no projeto nacional de internalização de medicamentos de alta complexidade tecnológica, a partir de Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDP).

 

O diretor informou que um dos principais desafios para o futuro está na absorção tecnológica dos medicamentos sosfosbuvir, everolimo e emtricitabina+tenofovir, mais conhecido como truvada, usado na Profilaxia Pré-Exposição ao HIV/Aids (PrEP). “Essas incorporações serão feitas por meio de um trabalho conjunto com empresas farmoquímicas e farmacêuticas nacionais. Além de tornar nosso portfólio ainda mais estratégico para hepatite C, HIV/Aids e imunossupressores (medicamentos para evitar rejeição de órgãos transplantados), a iniciativa fortalece este segmento industrial no país, gerando emprego e diminuindo a dependência internacional”, assinalou.

 

Marco Aurélio Krieger abordou, dentre outros temas, a importância do marco legal para a inovação no país (Foto: Viviane Oliveira)

No campo do conhecimento, Mendonça disse que o objetivo é fortalecer o sistema de capacitação tecnológica do SUS, a partir da implementação do Doutorado Profissional. “Dentro desta mesma proposta, no que for possível, nossa ideia é oferecer também uma linha de Mestrado e Doutorado acadêmicos”, destacou.

 

Produção pública e inovação – A Gestão, ou estratégia gerencial, tem papel fundamental para o futuro da produção pública de medicamentos, é o que sugeriram os especialistas que compuseram a mesa de debate sobre A Importância da Produção Pública de Medicamentos. Mediado pelo diretor Jorge Mendonça, o painel foi integrado pelo vice-presidente de Produção e Inovação em Saúde da Fiocruz, Marco Aurélio Krieger; pelo coordenador de Ações e Prospecção da Fiocruz, Carlos Grabois Gadelha; pelo consultor sênior e ex-diretor de Bio-Manguinhos, Artur Couto; e pelo secretário-executivo da Associação dos Laboratórios Oficiais do Brasil (Alfob), Luiz Marinho.

 

Para Carlos Gadelha, todos os segmentos que compõem a saúde são interdependentes e é preciso diálogo entre as instituições a fim de alcançar a inovação e melhor servir a sociedade (Foto: Viviane Oliveira)

O vice-presidente Marco Krieger ressaltou a participação determinante da Fiocruz na elaboração do decreto da Política de Inovação. “Uma das grandes contribuições da Fundação foi a inclusão do item que estabelece que todos os benefícios previstos para as instituições de ciência e tecnologia fossem também utilizados pelos órgãos públicos que tivessem atividade de produção. Neste caso, Bio-Manguinhos e Farmanguinhos terão os mesmos benefícios previstos na lei”, observou.

 

Segundo Krieger, embora países mais inovadores do que o nosso não tenham uma Lei de inovação, caso da Alemanha, por exemplo, as instituições públicas do Brasil precisam de mais flexibilidade na realização de compras de insumos ou na contratação de serviços.  “É importante porque quebra uma lógica um pouco complexa, de modo que para comprarmos um reagente específico somos obrigados a usar a mesma lei que uma prefeitura utiliza para comprar uma caneta de estudante. Isso não faz sentido”, avaliou o vice-presidente.

Dentre as mudanças previstas apontadas por Krieger está a realização de compras de até R$ 300 mil sem necessidade de licitação, ou a contratação de pesquisadores pelo regime de CLT dispensando empresa de terceirização. “São mudanças que vão melhorar a eficiência da nossa atividade de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e inovação”, salientou. Para ele, o grande desafio será incorporar esse marco legal nos processos de gestão. “É importante que todos se sintam seguros em utilizar esses benefícios da lei para que possamos entregar para a sociedade os conhecimentos gerados pela nossa pesquisa”.

Ex-diretor de Bio-Manguinhos, unidade da Fundação responsável pela produção de imunobiológicos, Artur Roberto Couto prestigiou o evento, apresentando a experiência daquele Instituto da Fiocruz (Foto: Viviane Oliveira)

Segundo Krieger, dentre algumas iniciativas da Fiocruz está o apoio a patentes para que as pesquisas se tornem produtos. Neste sentido, a Instituição lançou alguns editais de fomento, desde gestão do conhecimento até apoio à fase final do produto. O maior objetivo é levar os produtos até a fase pré-clínica.

 

Mudança da estratégia gerencial – Um dos idealizadores do Complexo Econômico e Industrial da Saúde (Ceis), Carlos Grabois Gadelha ressaltou que o SUS é um sistema complexo e que deve ser tratado sob uma perspectiva mais ampla. Segundo ele, todos os segmentos que compõem a saúde são interdependentes e é preciso diálogo entre as instituições a fim de alcançar a inovação e melhor servir a sociedade.

 

“Um SUS sem conhecimento, sem tecnologia, sem base produtiva, é um SUS frágil, que não se sustenta. Se o mercado financeiro internacional espirra, o SUS quebra. Se a taxa de câmbio sobe, o SUS não consegue se sustentar. Estou fazendo uma visão a longo prazo, uma visão de estabilidade estrutural. E essa política de estruturação não é uma política que encarece o SUS, mas que possibilita dar estabilidade para que seja um sistema forte e estruturante com ações a longo prazo”, ponderou.

 

Secretário-executivo da Associação dos Laboratórios Oficiais do Brasil (Alfob), Luiz Marinho disse que o maior desafio para o SUS é modernizar a gestão (Foto: Viviane Oliveira)

Nessa visão sistêmica, o especialista destacou o bom exemplo da parceria entre Farmanguinhos e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) com vistas à construção do Centro de Referência Nacional em Farmoquímica. A ideia é produzir Insumos Farmacêuticos Ativos (IFA), a principal substância do medicamento, responsável pelo efeito terapêutico.

 

Ainda de acordo com Gadelha, as PDP são um importante instrumento para a construção dessa nova cadeia produtiva estatal. As parcerias avançam em três pilares principais: atendimento ao SUS; construção da base produtiva nacional (que já representou 30% do PIB e, atualmente, caiu para menos de 10%); e Ciência, Tecnologia e Inovação. “Farmanguinhos é parte desse sistema, e se a unidade quer entrar no ramo das doenças infecciosas, que busque dialogar com o INI (Instituto Nacional de Infectologia), por exemplo. Somos parte de um complexo sistema e temos de dialogar”, alertou.

Ex-diretor de Bio-Manguinhos, unidade da Fundação responsável pela produção de imunobiológicos, Artur Roberto Couto apresentou a experiência daquele Instituto, criado juntamente com Farmanguinhos e que, portanto, está também completando 42 anos de produção pública. Ele ressaltou os inúmeros entraves decorrentes da burocracia legal e sugeriu uma mudança do modelo de gestão para superar os desafios. “Determinadas burocracias inviabilizam a atividade de produção, e nós não teremos sobrevida se não tivermos uma discussão sobre modelo de gestão”, observou.

 

Outro especialista que sugeriu uma discussão mais aprofundada sobre modelo gerencial foi o secretário-executivo da Associação dos Laboratórios Oficiais do Brasil (Alfob), Luiz Marinho. Segundo ele, o desafio mais importante para o SUS é modernizar a gestão. “Para isso, precisamos entender como funciona administrativamente cada laboratório. Nossa existência, enquanto laboratório oficial, é para suprir as necessidades do Sistema Único de Saúde. Portanto, ainda que exista uma política ministerial, que são as PDP, falta maior diálogo entre os laboratórios e os gestores das secretarias estaduais e municipais de saúde”, defendeu.

 

Integração – Além dos trabalhadores da unidade, estiverem na plateia os ex-diretores Núbia Boechat e Hayne Felipe da Silva, bem como representantes de algumas empresas parceiras, dentre as quais, Boehringer Ingelheim, Libbs, Blanver e Servier. Após o debate, os convidados e trabalhadores participaram de um almoço especial.

Se a tônica do debate foi maior integração entre os segmentos da área da Saúde, o Coral Sons de Far deu um ótimo exemplo de integração. O grupo apresentou os novos integrantes: colaboradores surdos, que emocionaram o público cantando em libras as canções de Dia das Mães. A banda Musical Clube animou o público com música ao vivo.

Hayne Felipe da Silva – ex-diretor de Farmanguinhos (2009-2017)); Marco Aurélio Krieger; Artur Couto; Luiz Marinho; Carlos Gadelha; Jorge Mendonça e Núbia Boechat – ex-diretora de Farmanguinhos (2003-2005) / Foto: Viviane Oliveira)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Música para os olhos: coral Sons de Far ganha o reforço de colaboradores surdos e dá demonstração de integração (Foto: Viviane Oliveira)